Editorial
DOI:
https://doi.org/10.5585/2025.28817Palavras-chave:
EditorialResumo
A educação pública brasileira atravessa um período de singular adversidade. A persistente aplicação de diretrizes neoliberais no âmbito educacional vem minando, há anos, os fundamentos da escola básica enquanto direito social inalienável. Observa-se, com crescente preocupação, a erosão sistemática do valor público da educação, materializada na fragilização das condições laborais dos docentes, na flexibilização predatória dos vínculos empregatícios e na expansão desmedida da terceirização. Esta lógica, que transforma o ensino em mercadoria, viabiliza ainda a apropriação de recursos estatais por conglomerados privados, nacionais e transnacionais, desvirtuando o sentido social da formação humana e educacional.
As consequências deste projeto ultrapassam a mera desestruturação material. Atingem o cerne da atividade docente, promovendo vigilância ideológica, restringindo a autonomia pedagógica e solapando a formação crítica de educadores. A chamada "plataformização" do ensino e outras medidas afins representam ameaças concretas à efetivação de uma educação emancipadora, democrática e comprometida com a justiça social.
É neste cenário desafiador que a revista Cadernos de Pós-Graduação reafirma seu compromisso intransigente com a defesa de uma educação pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada. Nossas páginas constituem-se como espaço privilegiado de resistência intelectual e produção de conhecimento engajado. Buscamos fomentar a crítica contundente à mercantilização do ensino e oferecer subsídios teóricos e práticos para a formação docente, a pesquisa em políticas educacionais e a gestão pública comprometida com o interesse coletivo.
O presente número materializa este propósito, reunindo investigações que tensionam os limites impostos pelo atual contexto e alargam os horizontes do debate educacional. Abrimos com um olhar necessário sobre a educação indígena. Elvis Rezende Messias, em "Da educação indígena no Brasil: decolonizando o olhar”, resgata a vitalidade formativa dos povos originários, evidenciando sua resistência histórica e suas ressignificações frente à violência colonial, destacando saberes ecossistêmicos ancestrais que dialogam surpreendentemente com demandas contemporâneas de complexidade e sustentabilidade.
Na perspectiva da emancipação pedagógica, Hélio Rodrigues dos Santos e Geraldo Eustáquio Moreira exploram, em “Etnomatemática e a Educação Emancipatória: diálogos de Paulo Freire e Ubiratan D’Ambrosio”, as potentes convergências entre o pensamento dos dois mestres. Demonstram como a Etnomatemática e a Pedagogia do Oprimido convergem na defesa do diálogo, da autonomia, da diversidade e da justiça social, constituindo-se como antídotos à pedagogia dominante que reproduz desigualdades.
A garantia do direito à educação inclusiva é abordada sob diferentes ângulos. Viviane Marques Miranda, em "A Fábula no Ensino de Libras como L1 para alunos surdos nas séries finais do Ensino Fundamental", propõe uma unidade didática inovadora utilizando fábulas em Libras, promovendo não apenas o domínio linguístico, mas também a reflexão ética e cidadã.
Thais Cristina dos Santos, Rita de Cássia dos Anjos e Camila Tonezer, em "A inclusão de alunos com deficiência visual: uma análise acerca das publicações em eventos nacionais de ensino de física” mapeiam e analisam as pesquisas sobre inclusão no ensino de Física, identificando ênfase na adaptação de experimentos e apontando necessidades na formação docente e na terminologia científica acessível.
Douglas Branco de Camargo, em “Qualidade de vida na docência: uma análise sistêmica e contextual em publicações CAPES (1990-2021)”, sintetiza pesquisas que atestam a multidimensionalidade do bem-estar docente, vinculando-o intrinsecamente a salários dignos, condições laborais adequadas e políticas de efetiva valorização.
Michele Terra e Anderson Brettas, em “A contratação temporária de professores na educação básica sob a influência do neoliberalismo”, desnudam os impactos perversos da precarização contratual sobre a profissão docente e a aprendizagem dos estudantes, exigindo revisão urgente das políticas públicas.
Gisiley Paulim Zucco Piolli e Mara Regina Martins Jacomelli, em “Reforma do Ensino Médio no Brasil: capital, trabalho e neoliberalismo em teses e dissertações (2017-2023)” analisam teses e dissertações que desvendam o dualismo, a influência de organismos internacionais e os interesses empresariais por trás da Reforma do Ensino Médio e as suas implicações são minuciosamente examinadas.
Carolina de Queiroz Silva Soares e Celso do Prado Ferraz de Carvalho, em “Desafios na implementação do Currículo da Cidade: perspectivas docentes na Rede Municipal de São Paulo”, trazem a voz dos docentes, expondo os desafios práticos, a falta de preparo, formações insuficientes, excesso de trabalho burocrático que comprometem a implementação de um currículo potencialmente avançado.
A educação em tempos digitais também se faz presente. Nathalia de Souza Silva e Edméa Oliveira dos Santos, em “A educação online na formação do pedagogo durante a pandemia”, exploram as potencialidades e reflexões geradas pela ciberpesquisa-formação na Pedagogia, enfatizando inclusão digital e atos de currículo pós-críticos.
Matheus Maramaldo Andrade Silva, em “Paisagismo EAD: facilitadores da projetação no meio digital” investiga como metodologias ativas podem superar os desafios específicos do ensino online de projetos paisagísticos, propondo caminhos para maior eficácia.
Por fim, a análise da gestão universitária pública é contemplada por Uyguaciara Veloso Castelo Branco e Kayo Mário de Aguiar Coutinho, em “A Universidade Estadual da Paraíba: criação, expansão e desafios para a gestão organizacional”. Utilizando a Matriz SWOT, os autores destacam a capilaridade da UEPB, mas também os sérios obstáculos financeiros impostos pela dependência de repasses estaduais e cortes orçamentários, ameaçando sua capacidade de inovação.
Cada artigo deste volume, à sua maneira, constitui um ato de resistência e um farol de possibilidade. São contribuições valiosas para pensar e construir alternativas ao desmonte em curso, reafirmando a educação como pilar essencial da cidadania e da justiça social. Convidamos a comunidade acadêmica e todos os defensores da escola pública a uma leitura atenta e crítica, na certeza de que o diálogo e a divulgação dessas reflexões são passos fundamentais na luta por um futuro educacional mais digno e democrático.
Boa leitura e contamos contigo na divulgação destes escritos,
Carlos Bauer
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